sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Caçadora de pétalas


Margaret Mee trocou o meio acadêmico inglês pela selva amazônica. No Brasil, em mais de 30 anos de viagens, ela descobriu plantas e pintou flores raríssimas. Mais que isso, denunciou a destruição da florestaA canoa navegava por um igarapé do rio Negro, na Amazônia, entre troncos de árvores parcialmente submersas, como restos de um templo abandonado. Copas frondosas logo acima da superfície fragmentavam a luz do sol que chegava à água. A inglesa Margaret Mee, 79 anos, em sua última viagem pela selva equatorial, entusiasmou-se ao ver cordões de cacto enlaçados ao redor de uma grande árvore, com botões de flor. Ela retornou ao local no dia seguinte e esperou até o anoitecer para, então, cumprir seu objetivo. Margaret sentiu-se "enfeitiçada" quando viu a primeira pétala se abrir, e outra após outra, tudo iluminado pela lua cheia e o auxílio de uma tocha.
A flor exalou um perfume bastante doce e, em uma hora, estava totalmente aberta. Encontrar a surpreendente "flor-do-luar" e desenhá-la era a meta da expedição da artista botânica. A planta só floresce à noite, por poucas horas, e nunca havia sido registrada em seu habitat.

PRIMEIRAS VIAGENS
Margaret Ursula Brown nasceu em Chesham, condado de Buckingham, em 1909. Estudou em três escolas de artes do país, foi colega do artista abstrato Victor Pasmore e, na sala de aula, conheceu seu futuro marido, Greville Mee. Em 1952, o casal deu uma guinada na vida. Depois de visitar a irmã no Brasil, Margaret ficou tão deslumbrada com as paisagens que acabou se mudando para São Paulo junto com o marido. Quatro anos depois partia para a primeira aventura na floresta. Chegou a Belém num pequeno avião de cargas.

“José, um índio de 7 anos, prontificou-se a me ajudar na colheita. Ele conseguiu para mim algumas plantas adoráveis, incluindo uma Bilbergia com folhas listradas”

O destino era o rio Gurupi. A amiga e escudeira Rita esteve a seu lado em todas as expedições. "Estávamos ambas vestidas para a selva - ou pelo menos pensamos que estávamos: calça jeans, camisa de manga longa, chapéu de palha e botas", escreveu Margaret em seu diário, hábito mantido sempre. As impressões e memórias da artista acompanham 60 das suas principais ilustrações no livro Flores da Floresta Amazônica.

Os trajes usados pela dupla de mulheres despertaram hostilidades no porto de Bragança, onde elas se estabeleceram por cinco dias, até surgir um barco que as levasse a Viseu (PA).

Nos primeiros dias na floresta, elas assimilavam a beleza daquele universo praticamente desconhecido. Os animais impressionaram muito a artista, que viu de perto uma aranha marrom e peluda "comedora de pássaros" e cenas como um camaleão tentando engolir um bicho-folha quase do tamanho dele. Mas nada era tão fascinante quanto as flores. A Couroupita está entre os primeiros desenhos.

“Eu estava tão impaciente para explorar a região que em minha primeira excursão até um campo próximo encontrei diversas plantas interessantes – uma Linda trombeta chinesa branca e amarela.”

Na segunda viagem, em 1962, a artista foi ao Mato Grosso. Nos rios Arinos e Alto Juruena, ela encontrou preciosidades como a Billbergia decora. À noite, passou a gostar da companhia dos macacos. "Eram também ótimos vigias, sempre dando sinal de alerta no caso de aproximação de uma onça ou pequenos gatos selvagens", escreveu. A expedição, porém, não se resumia a singelas aventuras de uma inglesa pequenina deslumbrada com a Amazônia.

A artista começava a perceber e registrar a degradação da floresta. "Esses belos mamíferos tornaram-se escassos desde que começaram a ser caçados para a retirada de suas peles", anotou, ao observar um grupo de ariranhas. A partir daí, e com a chegada cada vez mais intensa de indústrias, fazendas monocultoras e pecuaristas, as expedições de Margaret Mee sempre tiveram, acompanhando o trabalho artístico-científico, um clamor em defesa da natureza.

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